Percebendo que nada mais lhe restava fazer neste mundo, após ter amado tanto a todos e a tudo, Francisco pediu para retornar à Poriúncula. A irmã Morte estava vizinha. Chegado à planície, pediu que o colocassem sobre uma maca e, dirigindo seu olhar quase cego para o lado da cidade, invocou sobre ela e sobre os irmãos a bênção de Deus. Como ele amara a cidade de Assis, e como nela foi amado! Se Jesus disse que ninguém é profeta em sua terra, para Francisco ele fez exceção.
Nos últimos dias de vida, ditou o Testamento, autotestemunho de incalculável valor para a vida e os propósitos deste homem tão singular.
Com a proximidade da morte, pediu que o deitassem nu, no chão, unido à irmã Terra. Depois aceitou emprestado o hábito que o guardião lhe dá. Agradeceu mais esta esmola.
De São Damião veio o recado de Clara, dizendo que gostaria muito de vê-lo mais uma vez, ao que Francisco respondeu que “ir até lá não podia mais. Porém, elas o veriam mais uma vez”.
Pediu que chamassem frei Ângelo e frei Leão, para lhe cantarem mais uma vez o cântico do Irmão Sol. E várias vezes pedia que o repetissem, e ele acrescentava a estro da irmã Morte. Francisco lembrou-se de uma grande amiga romana, Jacoba de Settersoli, viúva de um patrício romano e mãe de dois filhos. Ao ir a Roma, Francisco se afeiçoara a ela e ela a ele. Gostava de ir à sua casa conversar e comer uns docinhos especiais que Jacoba sabia fazer.
“Vão a Roma, e contem a senhora Jacoba a minha situação. Ela gostará de saber. E peçam também que traga uma túnica e aquele doce de amêndoa que me preparava quando ia a Roma”. Mal acabou de falar, batem a porta. É Jacoba que chegava. Tinha sido avisada do estado do pai Francisco. Pela lei, nenhuma mulher podia ter acesso à Porciúncula, mas Francisco fez exceção, dizendo: “A proibição não vale para ela. Deixem entra ‘frei’ Jacoba”. Jacoba entrou, feliz por ver o grande amigo, abraçou-o com ternura, chorou e ofereceu-lhe a veste e o doce, que Francisco não pode mais comer.
Francisco pediu que lhe trouxessem um pão, partiu-o e deu um pedaço a cada um dos presentes, em sinal de amor mútuo e de paz, dizendo: “Eu fiz a minha parte. Que Cristo vos ensine a fazer a vossa”. Fez ler o Evangelho da Última Ceia e abençoou os filhos seus, presentes e futuros.
Na tarde de 3 de outubro de 1226, o mundo perdia seu filho mais original, mais santo, o único homem amado em todo o mundo e em todos os tempos. Francisco morreu, morreu cantando. “Frei” Jacoba foi chamada por um irmão: “Vem, para que possas tr nos braços depois de morto, aquele a quem tanto amaste quando vivo”. Foi ela a primeira pessoa que teve acesso a seu corpo, que foi colocado em seu colo, e ela ficou como Maria com o Filho morto. Jacoba viu as dolorosas chagas de Francisco. Chorava, gemia, soluçava e o abraçava ternamente. Jacoba nunca mais o esqueceu. Pouco depois veio morar em Assis, ali permanecendo até a morte.
Francisco tinha pedido para ser enterrado no cemitério dos criminosos, mas não o obedeceram. No dia seguinte, 4 de outubro, foi sepultado na igreja de São Jorge, na cidade de Assis. Antes, o cortejo fúnebre passou pelo mosteiro de São Damião, para a despedida de Clara e das Senhoras Pobres. Cumpria-se assim a promessa de Francisco de que Clara o veria mais uma vez. O corpo do Santo foi erguido, para que Clara e as clarissas pudessem vê-lo bem. E como choraram a falta do amigo querido! Clara e Jacoba, estas duas grandes mulheres, passaram os longos anos que lhe restaram de vida na saudade de Francisco.
No dia 16 de julho de 1228, o grande amigo franciscano Hugolino, agora Papa Gregório IX, vai pessoalmente a Assis para canonizar Francisco. O pai Francisco é agora o universal São Francisco de Assis.
Fonte: São Francisco. O Poeta da criação. Autor: Pe. José Artulino Besen. Editora: Mundo e Missão.